SER ARTISTA
A meta de
todo artista é tocar em Deus. Assim como a religião, a arte tem como um de seus
atributos principais; a pavimentação de um caminho que leve o individuo a
imortalidade.
A busca da
perfeição leva um artista a fazer descobertas espirituais, e a empregar o
máximo de esforço espiritual. A aspiração ao absoluto é a força que impele o
desenvolvimento da humanidade. Quando um artista, mesmo que inadvertidamente
revela o cinismo, o egocentrismo, a prepotência diante de uma situação
dramática, seja na arte ou na vida; o que para mim da no mesmo, ele mostra-se
desprovido de alma, de espírito, distanciando-se daquilo que comumente chamamos
- tocar em Deus.
Privada de
espiritualidade, a arte traz em si sua própria tragédia. Pois, até mesmo para
perceber o vazio espiritual do tempo em que vivemos, o artista deve ter
qualidades especificas de sabedoria e compreensão. O verdadeiro artista esta
sempre a serviço da imortalidade, lutando para imortalizar o mundo e o homem
nesse mundo. Um artista que não tenta buscar a verdade absoluta, que ignora os
objetivos universais em nome de coisas secundárias, não passa de um
oportunista. Alerta, artista, alerta, não te entregues ao sono... és refém da
eternidade e prisioneiro do tempo.
Num mundo em
que existe a ameaça real de uma guerra capaz de aniquilar a humanidade, onde os
males sociais existem em escala assustadora, e onde o sofrimento humano clama
aos céus – é preciso encontrar um modo de fazer com que as pessoas se encontrem
umas com as outras. Este e o dever sagrado da humanidade em relação ao seu
próprio futuro. Acredito na arte como elemento agregador e do artista como
veiculo. Desde que provido de espírito e alma.
Preciso da
imortalidade para que meu sangue continue a fluir de era para era. Eu
prontamente trocaria minha vida por um lugar seguro e quentinho se a agulha
veloz da vida não me puxasse pelo mundo como uma linha.
Então me
pergunto- como ser um artista criador desprovido de Eros, Caritas, Dionísio e Apollo
Mas tem de
haver mais.
FEMINILIZAR O MUNDO.
O QUE O TANTRA
tem a ensinar a todos nós, neste inicio de terceiro milênio, tem a ver com o retorno do feminino ao mundo. Como diz
a canção de Gil, `` minha porção mulher
que até então se resguardara´´ precisa
realmente tomar conta da situação. Senão vejamos: fala-se muito que este é o
século da mulher, mas o que vemos é a sociedade tornando-se cada vez mais
masculina, no pior que o masculino tem – a violência, o belicismo, a não
preocupação com a educação e o descaso com as gerações futuras.
Nos anos 60 e 70, falou-se muito em feminismo, mas o que
aconteceu foi a entrada maciça das mulheres na força de trabalho, em todo o
mundo, o que gerou independência financeira, mas não liberou a mulher de ser
objeto sexual. Apenas deu a ela o direito de fazer do homem também seu objeto sexual.
Ela se apropriou dos valores masculinos, apenas. E passou a desprezar os seus
próprios. Esses valores femininos são: o
amor, o afeto, as relações humanas verdadeiras,
o contato com a natureza das coisas, com a vida. E as crianças, visto que
as mulheres também é mãe. Soa também femininas a musica, a dança, a poesia, a
literatura. Feminina também é a doçura do lar, embelezado pela arte, vivificado
pelas flores, pelos animais e pelas crianças. Entretanto, os valores femininos
mais profundos transcendem o racional, mergulham no irracional. A consciência
da mulher é diferente; ela já percebeu as coisas, quando o homem ainda tateia
na escuridão. Esses valores também estão no homem, mas, como a educação
patriarcal os reprimiu, descobri-los é uma tarefa árdua. Por isso, no caminho
do Tantra, a mulher é a iniciadora. Ela abre para o homem as portas secretas
para a profundeza do ser, fazendo com que o homem desenvolva as qualidades da
intuição e transcendência. Isso é possível. E necessário para salvar a civilização.
Para sobrevivermos, precisamos voltar aos valores da Feminilidade. Se as mulheres
governassem o mundo, a humanidade não desperdiçaria esforços titânicos e somas
vertiginosas para fabricar todos esses fuzis, blindados, bombardeiros,
submarinos atômicos, ogivas nucleares, mísseis teleguiados... Cada um desses
engenhos, que custam fortunas, encarna o expansionismo patriarcal, e este leva
inevitavelmente à guerra, como no tempo do roubo de gado pelos pastores nômades.
Mãe alguma deseja ver seus filhos e netos servirem de carne para canhão.
Não é o triunfo do feminino sobre o masculino, nem uma
revolução da doçura, mas uma mutação, uma revolução interior progressiva, tanto
do homem como da mulher. Quanto mais pessoas de todos os níveis forem
conquistadas para essa nova consciência, mais teremos possibilidade de frear a
loucura de uma globalização que destrói a Vida
no planeta, em nome do Mercado. Mas, para mudar o mundo e fazer reviver os
antigos valores da Feminilidade, é preciso ver, pensar e agir de modo diferente.
É preciso que a mulher tome consciência de seu valor, tanto
quanto de seus papéis, de seu gênio, tanto quanto de seu peso na sociedade, e
ela mudará o mundo.
Existem os movimentos míticos do homem e da mulher. Eles
estão sendo vividos de maneira desordenada hoje. Ao masculino, no mito, cabe a
iniciativa, e a parte feminina do homem tem a ver com seu relacionamento com o
mundo. Enquanto o homem defende a mulher dos perigos externos do mundo, ela o
protege dos perigos internos, criados no seu inconsciente.
Uma sociedade do futuro, integrada e madura, com seus
participantes vivendo em plenitude, seria uma sociedade com muito mais
compaixão, discriminação, discernimento, generosidade, responsabilidade,
alegria e... amor.
Uma sociedade do futuro pode e deve ser tântrica: afinal, o Tantra é recomendado pelos mestres
da Antiguidade como a pratica para estes tempos de Kali yuga, isto é, da era de
Kali, a era da degenerescência, que é exatamente onde estamos agora. Estamos
vivendo em plena era de Kali, a era do ferro, a era crepuscular do fim dos
tempos, profetizada nas escrituras indianas. Kali, aqui, significa discórdia,
conflitos, disputas. É a era em que a sociedade humana chega ao seu nível
Maximo de degenerescência, de barbárie, de desintegração. Alguma analogia?
Será que o homem de nossa era poderá transmutar seu desejo e
ver a mulher como ``uma expressão do poder criador cósmico´´? Poderão o homem e
a mulher de hoje se converterem em energia, pólos masculinos e femininos, shiva
e shakti, de acordo com a tradição tântrica? Enquanto isso seja La o que possa
acontecer nesta era, somente a pratica de um
amor em que o homem e a mulher usem energia poderosa com respeito mútuo,
visão espiritual, meditação pode transformar o mundo. ``É o melhor que trago em mim agora... por causa da mulher!...´´
Mas tem de haver mais.
Transpessoalidade no teatro
HAVERÁ AINDA
NO MUNDO,
COISAS
TÃO SIMPLES E TÃO PURAS
COMO A AGUA BEBIDA
NA CONCHA DAS MÃOS?
`` Gauguin
achava que o artista deveria buscar o símbolo, o mito, ampliar as coisas até o
mito, enquanto Van Gogh achava que é preciso deduzir o mito das coisas mais
modestas da vida. ´´(A. Artaud)
``Encarar a
vida como um poema e a você mesmo como participante de um poema, é o que o mito
faz por você. ´´ ( Joseph Campbell)
Um conceito.
Mais um conceito. Não acrescenta muita coisa amontoando-se nas prateleiras das
justificativas. O Teatro é o Teatro e, aliás, é mais que isso. Ele é tanto que
consegue ser todos os nomes que se inventa para ele: teatro físico, pobre,
vazio, grego, dança, essencial, invisível, verticalizado, da crueldade,
religioso e os cambaus.
Todos os
povos têm lendas épicas sobre seus antepassados tribais, e muitas vezes essas
lendas tomam a forma de cultos religiosos. Os povos reverenciam e até mesmo
cultuam seus antepassados reais e não os deuses sobrenaturais que detêm a chave
da compreensão da vida. De todos os organismos que nascem à maioria morre antes
de atingir a maturidade. Da minoria que sobrevive e se reproduz, uma minoria
ainda menor terá um descendente vivo daqui a mil anos. Essa diminuta minoria da
minoria, esta elite de progenitores, é tudo o que as gerações futuras serão
capazes de chamar de ancestrais. Os ancestrais são raros, mas os descendentes
são comuns.
Segundo a
psicologia transpessoal, filtrada pelo nosso pensamento, a experiência
transpessoal relaciona-se a uma dimensão que ultrapassa o limite da compreensão
do individuo enquanto fragmento de um meio sócio cultural. Indica uma noção de
que não se esta mais condicionado pelos ritmos, leis, e tensões da vida cotidiana.
Levanta-se a possibilidade de um momento extratemporal em que nem o universo
nem os mitos haviam sido criados ainda. Uma consciência muito alem do sonho e
da vigília. Essa dimensão de pensamento abole qualquer tipo de idéia de tensão
e nos coloca dentro da esfera do retorno simbólico á `situação inicial´ quando
a unidade primordial não se havia dispersado pela ação da criação.
No estado
transpessoal não há mascaras. Acreditamos que a experiência transpessoal
realiza ou configura uma sensação, um enlevo ``epifanico´´, uma
supraconsiencia. Relaciona-se a formas de êxtase psíquico, insihts ou formas alteradas
de consciência que podem ser provocadas, não apenas quando realizamos
exercícios específicos, mas também, por exemplo, quando se escuta uma musica
arrebatadora, se assiste ao esplendor do raiar do dia, se admira a imensidão do
oceano, se Le um poema revelador.
Alargar
limites da consciência facilita de modo extraordinário o incorporar dos
sentidos e energias essenciais que habitam um determinado caráter, persona ou
personagem.
Vale
ressaltar que a experiência transpessoal que nos interessa demanda uma mente
relaxada e quieta, sobretudo, liberta de sistemas ou credos. `` Nua, livre de amarras, mesmo de origem, a qualquer religião que seja
(Bataille).
Não há
exercício de criação, experiência em cena ou resgate de memória/imagens
pessoais ou impessoais, emocionais. O ator/médium vive o drama do seu
personagem de forma verticalizada, não deixa lacunas para escapismos seja ela
de qualquer espécie. Acreditamos que a transpessoalidade em cena transita, ou
melhor; habita na zona de libertação, de desistência, no espaço do vazio, entre
aquilo que quero fazer e o que deveria ser feito/realizado. Pensamos que o ator
transpessoal trás em si o silencio, o território desconhecido e não habitado em
nos mesmos, de onde poderá emergir de forma inadiável e inaugural aquela
qualidade de energia que antecede a fala, o gesto, o ser, o querer, o estar.
O ator/médium,
acreditamos, devera perseguir como a um deus, o desenvolvimento do seu olhar
interior, sua audição interior, sua fala interior, seu gesto interior. Isto
produziria uma forma de sentir: o espaço e os objetos aí inseridos
amalgaman-se; o tempo é sentido como eternidade. E o olho interior se manifesta
então da-se a exteriorização do olho do coração, que designa clarividência.
Pesquisando o significado na simbologia universal, aprende-se que, tradicionalmente,
o olho direito, o Sol corresponde à atividade e ao futuro; o olho esquerdo, a
Lua, à passividade e ao passado. A função do terceiro olho é possibilitar a
percepção unitiva dos opostos. È um órgão de visão interior. Situado no limite
entre a vacuidade, entre a unidade e a multiplicidade, permite que elas sejam
apreendidas simultaneamente.
Pensar,
olhar, sentir e agir pelo prisma do coração, possibilitara ao ator a
transpessoalidade; a aproximação e comunhão. Levando-o de encontro a aquilo ao
qual nos referimos anteriormente – o teatro esta ligado a forças, baseado em
crenças afetivas, e cuja eficácia se traduz em gestos e atitudes.
Pensamos que
o ator/médium transpessoal é um ser dotado de grande capacidade de pensar a
vida e a arte através do coração.
``O homem sábio é aquele que pensa com o coração. (Salomão).
``O homem sábio é aquele que pensa com o coração. (Salomão).
Mas tem de
haver mais.
Al.
Al.
Uma espera sem fim
Um vai e vem de chuvas, dias e outono atonal,
Vento frio, riso frio, dias e noites a consumir-se
Falo com pessoas,
passo por lugares, e penso pensar,
Toquei uma flor, morada de insetos picantes e febris
Meu peito cala a voz não diz coisas... cala,
Já sonho, mimi, quem sabe talvez sonhar e ninar
Meu gato que não veio, meu cão estradeiro, e eu mulá sem arreio,
Pasto eu descanso, se parar é seguir adiante,
E espero ouvindo uma sinfonia será a do adeus
Deus meu, agora já sei, saltar no tempo cair no espaço
De braços vazios de dor e solidão,
São todos os meus, sou de todo meu eu que espera,
Era uma era, um sertão tão aqui, no peito de cada um.
Meu rio, digo riso largo e profundo, pro fundo do mundo,
Dirige-se a passos voadores, a cruzar vales e montanhas,
A brincar de pássaros terrestres, infectos voadores da alma
E coração de valente, quase sempre a esperar os contentes
Com sorrisos sem dentes, banguelas em janelas de alma e
rugidos
Mudos, esperam por mudanças, esperam chegadas, se ficam
Partem em partes pedaços, nacos, fiapos nas banguelas dos
ventres
Tudo parece estar pronto, o cenário, o ambiente posto, o moço
a moça
O jantar o café o almoço, e a mesa tão farta
Vazia de amor e de paz a espera, da espera que espere...
espera... sem fim
Verdade é ver
Septem Sermonus ad mortus
Prestai atenção: começo pelo nada. O nada equivale à plenitude. No infinito, o pleno não é melhor que o vácuo. O nada é, ao mesmo tempo vácuo e plenitude. Dele se pode dizer tudo o que se quiser: por exemplo: que é branco ou preto, ou então que existe, ou não. Uma coisa infinita e eterna não possui qualidades, pois tem todas as qualidades.
No meio da noite os mortos, parados em pé contra a parede, bradaram: Queremos ver Deus. Onde esta? Morreu?
Deus não morreu. Agora, como sempre vive. Deus é criatura, coisa definida e, portanto, distinta do pleroma. Deus é qualidade do pleroma e tudo o que eu disse da criatura também se aplica a ele. Distingui-se, porem, dos seres criados no sentido de que é mais indefinido e interminável do que eles. É menos diferencial que os seres criados, pois a base de sua existência é a plenitude efetiva. Só na medida em que for definido e distinto é criatura e na mesma proporção é manifestação da plenitude efetiva do pleroma.
III Sermão.
Como a neblina que se ergue de um pântano, os mortos avançaram clamando: Explica melhor esse deus supremo.
É difícil definir a divindade de Abraxas. Seu poder é o maior porque o homem não o percebe. Do Sol, retira o summum bonum; do Diabo, o infimum malum; mas de Abraxas, a VIDA, totalmente indefinida, a mãe do Bem e do Mal.
IV Sermão.
Os mortos encheram de murmúrios o recinto e disseram: fala-nos dos deuses e dos diabos, maldito!
O Deus-Sol é o bem supremo; o Diabo o oposto. Assim, tendes dois deuses. Mas há muitas coisas supremas e boas e muitos males enormes. Entre estes há dois deuses-diabos: um, o ARDENTE, outro, o CRESCENTE.
Os mortos escarneceram e vociferaram: Ensina-nos, tolo, a respeito da igreja e da santa comunhão.
O mundo dos deuses se torna manifesto na espiritualidade e na sexualidade. Os celestes aparecem na espiritualidade, os terrestres na sexualidade.A espiritualidade concebe e acalenta. É feminina e por isso a chamamos de MATER COELESTIS, a mãe celeste. A sexualidade gera e cria. Masculina, a chamamos de PHALLOS, o pai terrestre.A sexualidade do homem é mais da terra: a da mulher, mais espiritual.A espiritualidade do homem é mais do céu, vai mais para o vasto.A da mulher, mais da terra, vai para o mais ínfimo.Mendaz e diabólica é a espiritualidade do homem que vai para o mais ínfimo.Mendaz e diabólica é a espiritualidade da mulher que vai para o mais vasto.Cada um deve ir para seu próprio lugar.O homem e a mulher, quando não dividem seus caminhos espirituais, tornam-se diabos um para o outro, pois a natureza da criatura é a individualidade.A sexualidade do homem tem curso terreno, a da mulher, espiritual. O homem e a mulher, quando não distinguem sua sexualidade, tornam-se diabos um para o outro.O homem conhecera o menor, a mulher o maior. O homem se distinguira da espiritualidade e da sexualidade. Chamara à espiritualidade Mãe, colocando-o entre o céu e a terra. E a sexualidade Phallos, colocando-a entre si mesmo e a terra. Pois Mãe e Phallos são demônios super-humanos que revelam o mundo dos deuses. São para nós mais efetivos que os deuses, por terem maior afinidade com a nossa própria natureza. Se não vos distinguirdes da sexualidade e da espiritualidade e não as considerar-des de uma natureza além e acima de vós, então vos entregareis a elas como qualidades do pleroma. A espiritualidade e a sexualidade não são qualidades vossas, nem coisas possuís e contendes, mas que vos possuam e contêm; pois são demônios poderosos, manifestações dos deuses e, por conseguinte, coisas, que vos ultrapassam, e existentes em si mesmas. Nenhum homem tem espiritualidade ou sexualidade próprias. Mas coloca-se sob a lei da espiritualidade e da sexualidade.
VI Sermão.
O homem é pórtico, pelo qual, vindos do mundo exterior de deuses, demônios e almas passais para o mundo interior; saindo do mais vasto para penetrar no mais ínfimo. Pequeno e efêmero é o homem. Já se encontra atrás de vós e mais e mais uma vez vos achais no espaço sem fim, no menor ou mais íntimo infinito. A incalculável distancia paira uma estrela solitária no zênite.
ANAGRAMA:
Eu escrevi um poema triste
Verdade Verdadeira.
Verdade é ver
através do cheiro
da cor, da pele
do arrepio, do paladar!
Verdade é a pedra
que não se move sozinha,
que constrói e destrói.
Verdade é a morte.
Verdade é o que deveria
ser visto, dito, sentido... mas
sempre foi omitido.
Verdade mesmo!
é a espontaneidade
dos gestos e das
vozes que se calam
y falam.
Verdade, verdadeira
é a que se vê até
de olhos bem fechados.
Verdade é a
espontaneidade
da idade,
sem espelho...
Verdade é uma
viagem do pensamento
verdade é por ti
meu sentimento.
Verdade é viver
a vida, sem ser
a vida sobrevivida
e nem o desejo
de amá-la omitida.
Verdade
são os teus olhos
de encontro aos meus olhos.
Verdade, esta em suas mãos,
só não vê, quando não
tem mão que vê!
Verdade, verdadeira
estou pra ver... e verdadeiramente
viver... verdade e
dizer- amo você.
Contador de
Historias...
Ele era pobre, mas despreocupado e feliz, livre como um
saltimbanco, sonhando cada vez mais alto. Em boa verdade estava apaixonado pelo
mundo. Porem, o mundo a sua volta parecia-lhe sombrio de coração, brutal, seco
de alma e espírito, ele sofria com isso.<<Como>> perguntava-se
<< fazer com que seja melhor? Como trazer à bondade a estes tristes que
vão e que vem sem olhar para seus semelhantes? Ruminava estas perguntas
enquanto andava pelas ruas de sua cidade natal, vagueando e saudando as pessoas
que, no entanto, não lhe respondiam.
Ora, uma manhã enquanto atravessava uma praça cheia de sol
teve uma idéia. << E se lhes contasse historias?>>>>>>>>,
pensou. << Assim, eu, que conheço o sabor do amor e da beleza ajuda
–los-ia a encontrar a felicidade >>. Pos-se em cima de um banco e começou
a falar. Os velhos, as mulheres e as crianças admirados pararam por um momento a
ouvi-lo, mas depois viraram as costas e prosseguiram o seu caminho.
Mas ele achando que não poderia mudar o mundo num só dia não
desistiu de sua jornada. No dia seguinte, voltou aquele mesmo, lugar e lançou
ao vento com voz forte, as mais belas e comoventes palavras. Algumas pessoas
pararam a ouvi-lo, mas agora eram em numero menor que no dia anterior. Alguns riram
dele. Houve até quem o chama-se louco. Mas não quis ouvir, << as palavras
que estou semeando um dia germinarão>>, pensou. Um dia entrarão nos
espíritos e acordala-los-ão. Tenho de falar, falar mais ainda.
Teimou, pois, e dia após dia voltou àquela grande praça de
sua cidade natal para falar ao mundo, contar maravilhas, oferecer aos
semelhantes todo o amor que sentia. Todavia os curiosos cada vez mais
tornavam-se mais raros, em breve ele estava falando para as nuvens, o vento e
silhuetas que passavam apressadas, que já só lhe lançavam uma olhadela
apressada e de espanto à medida que passavam. No entanto, não desistiu.
Descobriu que não sabia, nem desejava fazer outra coisa que
não contar suas historias, mesmo que estas não interessassem a ninguém. Começou
a dizê-las de olhos bem fechados, pela única felicidade de poder ouvi-las. Sem
se preocupar em ser ouvido. Sentiu-se bem, e a partir dali: só falava de olhos
bem fechados. As pessoas temendo relacionar-se com suas extravagâncias
deixaram-no, só com suas historias, e habituaram-se, assim que ouviam sua voz
lançada ao vento a evitar a esquina daquela praça onde ele se encontrava.
Assim, os anos foram passando. Ora, numa noite de inverno
enquanto- sob um crepúsculo indiferente – contava uma lenda prodigiosa sentiu
que alguém o puxava por uma manga. Abriu os olhos e viu uma criança, que
fazendo uma careta engraçada, lhe disse, esticando-se nas pontas dos pés:
- Não vês que ninguém te ouve, nunca te ouviu e jamais te ouvirá?
O que te levou a viveres assim a vida?
- Estava louco de amor por meus semelhantes – respondeu –
foi por isso que, no tempo que ainda não o eras nascido me veio o desejo de torná-los
felizes.
Replicou o fedelho.
- Pois bem, pobre louco, e eles são-no?
Não, disse ele – balançando a cabeça.
- Por que razão teimas então? Perguntou ternamente a criança
tomada por repentina piedade.
Nosso contador refletiu por instantes.
- Eu conto sempre, é claro e contarei até morrer – disse –
dantes eu contava para mudar o mundo.
Calou-se; e depois seu olhar iluminou-se; e acrescentou:
- Hoje, conto para que o mundo não mude, a mim.
Septem Sermonus ad mortus
Jung autorizou a
publicação de Sete Sermões aos Mortos
em caráter particular, sob a forma de folheto, para distribuir a pessoas
amigas. Nunca foi posto a venda nas livrarias. Mais tarde qualificou-o de
pecado de juventude, arrependendo de tê-lo divulgado.
A linguagem lembra o
estilo do Livro Vermelho, mas, ao
contrario dos intermináveis diálogos com os alter-egos do Livro Vermelho, os Sete
Sermões formam um todo autônomo. Transmitem a impressão, se bem que
fragmentaria, do que Jung passou entre os anos de 1913 a 1917, e do que viria a
criar.
Neles se encontram
sugestões ou antecipações de idéias que seriam desenvolvidas subseqüentemente
em teses cientificas, sobretudo as referentes á natureza polaristica da psique,
da vida em geral e de todos os postulados psicológicos. Jung sentiu-se atraído
pelo raciocínio por paradoxos que é típico do gnosticismo. Por isso se
identifica aqui com o escritor Basilides (gnóstico do inicio do segundo século
da era cristã) e até recorre à terminologia usada por ele – chamando Deus, por
exemplo, de Abraxas. Tudo obedece a um plano de deliberada mistificação
.
Jung consentiu na
inclusão dos Sete Sermões em suas
Memórias após certa hesitação e apenas``pelo amor a honestidade´. Jamais
revelou a chave do anagrama no fim do ultimo sermão.
Os Sete Sermões aos
Mortos, escritos por Basilides em Alexandria, a cidade onde o Oriente
encontra o Ocidente.
I Sermão.
Os mortos voltaram de Jerusalém, onde não encontraram o que procuravam.
Pediram-me guarida e imploram que lhes falasse. Assim comecei a ensinar.
Prestai atenção: começo pelo nada. O nada equivale à plenitude. No infinito, o pleno não é melhor que o vácuo. O nada é, ao mesmo tempo vácuo e plenitude. Dele se pode dizer tudo o que se quiser: por exemplo: que é branco ou preto, ou então que existe, ou não. Uma coisa infinita e eterna não possui qualidades, pois tem todas as qualidades.
A esse nada ou plenitude da-se o nome de PLEROMA. Nesse particular cessam o
pensar e o ser, já que o eterno e infinito não possui qualidades. Nele nenhum
ser é, porque senão se diferencia do pleroma e possuiria qualidades que o
distinguiriam como algo inconfundível.
No pleroma não existe nada e tudo existe. É absolutamente
inútil pensar no pleroma, pois redundaria em autodissolução.
A CRIATURA não esta no pleroma, mas em si mesma. O pleroma é
simultaneamente, o começo e o fim dos seres criados. Impregna-os, como a luz
impregna o ar em todo lugar. Apesar de impregnado por completo, nenhum ser
criado retem parte do pleroma, assim como o corpo
inteiramente translucido não se torna claro nem escuro com a
luz que o impregna. Somos, porém, o próprio pleroma, pois integramos o eterno e
o infinito. Mas não retemos nenhuma parte sua, por estarmos infinitamente
afastados, não em forma espiritual ou
temporal, e sim
essencial, pois nos diferenciamos dele por nossa essência de
criatura, confinada no tempo e espaço.
No entanto, dele fazermos parte, o pleroma também esta em
nos. Até mesmo no seu grau mais ínfimo não tem fim, é eterno, e inteiro, pois
pequeno e grande são qualidades nele contidas. É aquele nada que se acha
completo e continuo em todo lugar. Só no sentido figurado, portanto, me refiro
ao ser criado como parte do pleroma. Porque na realidade, o pleroma não se
divide em nenhum lugar, uma vez que equivale ao nada. Também somos o pleroma
inteiro, porque, no sentido figurado, o pleroma é o menor ponto (apenas
suposto, não existente) em nos e no firmamento ilimitado que nos rodeia. Mas,
por que então, falamos afinal no pleroma, já que é assim, tudo e nada?
Falo nele para partir de algum começo e também para tira-vos
a ilusão de que em algum lugar, seja fora ou dentro, existe algo determinado,
ou de qualquer forma estabelecido, desde o inicio. Toda coisa que se diz
determinada e certa é apenas relativa. Só é determinado e certo o que for
possível de ser modificado.
O que é modificável, porem, é a criatura. Por conseguinte, é
a única coisa que esta determinada e certa; porque tem qualidade; inclusive é a
própria qualidade.
Impõe-se a pergunta: como se originou a criatura? Os seres
criados perecem, a criatura não; pois o ser criado é a própria qualidade de pleroma,
tanto quanto a não criação, que equivale à morte eterna. Em todos os tempos e
lugares existe a morte. O pleroma tudo possui, individualidade e
não-individualidade.
A individualidade equivale à criatura. É única. Constitui a
essência da criatura e, portanto, a diferencia. Por conseguinte, o homem
discrimina porque a individualidade faz parte da sua natureza. Daí também por
que se distinguem no pleroma qualidades que não existem. Distinguem-nas por
causa da sua própria natureza. Há, pois que falar de qualidades do pleroma que
não existem.
Qual a utilidade,
direis de falar nisso? Não foste tu mesmo que disseste que não adianta pensar
no pleroma?
Isso eu vos disse, para tirar-vos a ilusão de que podemos
pensar nele. Quando distinguimos qualidades no pleroma, falamos tomando por
base a nossa própria individualidade e a respeito dessa mesma individualidade. Mas
nada dissemos a respeito do pleroma. A respeito da nossa própria
individualidade, porem é preciso falar, para podermos distinguir
suficientemente a nos mesmos. A nossa própria natureza é individualidade. Se
não formos fiéis a essa natureza, não nos distinguiremos suficientemente bem.
Temos, portanto, que fazer distinções de qualidades.
Qual o prejuízo, perguntareis, em não se distinguir a si
mesmo? Se não nos distinguirmos, ultrapassando nossa própria natureza, nos
afastamos da criatura. Caímos na falta de individualidade, que é a outra qualidade
do pleroma. Caímos no próprio pleroma e deixamos de ser criaturas. Nos
entregamos à dissolução no nada. O que resulta na morte da criatura. Morremos,
portanto, na medida em que não nos distinguimos. Daí o empenho natural da
criatura para adquirir individualidade, para lutar contra a igualdade inicial,
perigosa. A isso dá-se o nome de PRINCIPIUN INDIVIDUATIONIS. Esse
principio é a essência da criatura. Com isso podeis ver por que a falta de individualidade e a não-distinção
constituem grande risco para a criatura.
Devemos, pois, distinguir as qualidades do pleroma. Essas
qualidades são ANTONIMAS, como, por
exemplo:
O efetivo e o inefetivo.
Plenitude e Vácuo.
Vivos e Mortos.
Diferença e igualdade.
Luz e Trevas.
O Quente e o Frio.
Força e Matéria.
Tempo e Espaço.
O Bem e o Mal.
Beleza e Fealdade.
O Uno e o Múltiplo, etc.
As antônimas são qualidades do pleroma que não existem, pois
uma contrabalança a outra. Como constituímos o próprio pleroma também possuímos
todas essas qualidades em nós. Por ser a própria base de nossa natureza a
individualidade, possuímos, portanto, essas qualidades em nome e sinal da
individualidade, o que quer dizer que:
Essas qualidades são distintas e separadas umas das outras
em nos: por conseguinte, não são contrabalançadas e nulas, e sim efetivas.
Somos assim vitimas dessa antinomia. O pleroma está dividido em nós.
1. As
qualidades pertencem ao pleroma e só em nome e sinal da individualidade podemos
e devemos possui-las ou vivê-las. Temos que nos distinguir das qualidades. No
pleroma estão contrabalançadas e nulas; em nós não. Sermos distantes delas
liberta-nos.
Quando nos empenhamos no bem ou no belo,
esquecemos conseqüentemente a nossa própria natureza, que é a individualidade,
e nos entregamos às qualidades do pleroma, que são antônimas. Lutamos para
conseguir o bem e o belo, mas ao mesmo tempo também ficamos com o mal e o feio,
que no pleroma são inseparáveis do bem e do mal. Quando, porem, permanecemos
fiéis à nossa própria natureza, que é a individualidade, nos distinguimos do
bem e do belo e, portanto, ao mesmo tempo, do mal e do feio. E assim não mergulhamos
no pleroma, ou seja, no nada e na dissolução.
Tu
dizes, contraporeis, que a diferença e a igualdade também são qualidades do
pleroma. Como seria, então, se nos empenhássemos na diferença? Agindo assim,
não estamos sendo fiéis à nossa natureza? E, apesar disso, não devemos nos
entregar à igualdade quando nos empenhamos na diferença?
Não deveis esquecer que o pleroma carece de
qualidades. Somos nós que as criamos pelo raciocínio. Se, porem, vos
empenhardes na diferença ou na igualdade, ou em qualquer outra espécie de
qualidade, estareis imersos em raciocínios inspirados pelo pleroma. Na
proporção em que vos lançardes a esses raciocínios, tornareis a cair no
pleroma, atingindo ao mesmo tempo a diferença e a igualdade. Não é o vosso raciocínio e sim o vosso ser que
constitui a individualidade. Por conseguinte, ao contrario do que supondes, não é na diferença que deveis vos
empenhar, mas no VOSSO PROPRIO SER. No
fundo, pois, existe apenas um empenho, ou seja, o empenho no vosso próprio ser.
Se tiverdes esse empenho, não precisareis saber nada a respeito do pleroma e
suas qualidades e ainda assim atingireis a meta almejada em virtude de vosso
próprio ser. Como, porem, o raciocínio se aparta do ser, devo ensinar-vos esse
conhecimento, por meio do qual podereis refrear vossos pensamentos.
II Sermão.
No meio da noite os mortos, parados em pé contra a parede, bradaram: Queremos ver Deus. Onde esta? Morreu?
Deus não morreu. Agora, como sempre vive. Deus é criatura, coisa definida e, portanto, distinta do pleroma. Deus é qualidade do pleroma e tudo o que eu disse da criatura também se aplica a ele. Distingui-se, porem, dos seres criados no sentido de que é mais indefinido e interminável do que eles. É menos diferencial que os seres criados, pois a base de sua existência é a plenitude efetiva. Só na medida em que for definido e distinto é criatura e na mesma proporção é manifestação da plenitude efetiva do pleroma.
Tudo o que não distinguimos mergulha no
pleroma e se anula pela antinomia. Se, portanto, não distinguimos Deus. A
plenitude efetiva se extingue para nós.
Alem disso, Deus é o próprio pleroma, da
mesma maneira que cada ponto infinito no criado e no incriado é o próprio
pleroma.
O vácuo efetivo é a natureza do Diabo. Deus e o Diabo são as
primeiras manifestações do nada, que chamamos de pleroma. É indiferente que o
pleroma exista ou não, uma vez que tudo é contrabalançado e nulo. A criatura já
não é assim. Na medida em que Deus e o Diabo são criaturas, não se anulam e sim
erguen-se um contra o outro, como antônimos efetivos. Não precisamos de provas
da sua existência. Basta que sempre se esteja falando neles. Ainda que ambos
não existissem, a criatura, por causa de sua individualidade essencial, sempre
os distinguira de novo no pleroma.
Tudo o que a discriminação distingue no pleroma é antinomia.
Deus, portanto, sempre corresponde ao Diabo.
Essa inseparabilidade é tão intima e, como vossa própria
vida lhe fez ver, tão indissolúvel quanto o próprio pleroma. Assim é que os
dois se mantêm muito próximos do pleroma, no qual todos antônimos se anulam e
se fundem.
Deus e o Diabo se distinguem pelas qualidades de plenitude e
vácuo, criação e destruição. A
EFETIVIDADE é comum a ambos. A efetividade os une. Paira, portanto,
sobre ambos, é um deus acima de Deus, já que em seu efeito
reúne a plenitude e o vácuo.
Esse é um deus que não conheceis, pois a
humanidade o esqueceu. Nós o chamamos pelo seu nome, ABRAXAS. É ainda mais
indefinível que Deus e o Diabo.
O deus que se pode definir, nós o chamamos de
deus HELIOS, ou Sol. Abraxas é efeito, nada se antepõe a ele que não seja
inefetivo, daí que a sua natureza efetiva se desdobre livremente. O inefetivo
não existe, portanto não resiste. Abraxas paira acima do Sol e acima do Diabo. É a probabilidade improvável, a
realidade irreal. Tivesse o pleroma um ser, Abraxas seria a sua manifestação. É
o próprio efetivo, não algum efeito, mas o efeito em geral.
É a realidade irreal porque não tem efeito definido.
É também criatura, por ser diferente do pleroma.
O Sol tem um efeito definido e o mesmo acontece com o Diabo.
Por isso nos parecem mais efetivos que o indefinido Abraxas.
É força, duração, mudança.
Os mortos então
provocaram grande tumulto, pois eram cristãos.
III Sermão.
Como a neblina que se ergue de um pântano, os mortos avançaram clamando: Explica melhor esse deus supremo.
É difícil definir a divindade de Abraxas. Seu poder é o maior porque o homem não o percebe. Do Sol, retira o summum bonum; do Diabo, o infimum malum; mas de Abraxas, a VIDA, totalmente indefinida, a mãe do Bem e do Mal.
A vida parece ser menor e mais frágil que o summum bonum; por
isso é também difícil conceber que Abraxas transcenda em poder até o Sol, que é
a fonte radiosa de toda a vida.Abraxas é o Sol e ao mesmo tempo a garganta eternamente voraz do vácuo,
o Diabo menosprezador e mutilante.
O poder de Abraxas é duplo; mas não o vedes, porque para
vossos olhos os antônimos incompatíveis se anulam.
O que o Deus - Sol fala é vida.
O que o Diabo fala é morte.
Mas Abraxas fala aquela palavra sagrada e maldita que é a
vida e morte ao mesmo tempo.
Abraxas gera a verdade e a mentira, o Bem e o Mal, a luz e
as trevas, na mesma palavra e no mesmo ato. Por isso é Abraxas terrível.
É magnífico como o leão no momento em que ataca a vitima.
Bonito como um dia de primavera. É o próprio grande Pã e também o pequeno. É
Priapo.
É o mostro das profundezas, pólipo de mil tentáculos, nó
emaranhado de serpentes aladas, frenesi.
É o hermafrodita dos tempos imemoriais.
É o senhor dos sapos e rãs, que vivem nas águas e sobem à
terra, cujo coro se eleva à tarde e à
meia-noite.
É a abundancia que busca a união com o vácuo.
É a sagrada procriação.
É o amor e o assassino do amor.
É o santo e seu traidor.
É a mais brilhante luz do dia e a mais negra noite de
loucura.
Contemplá-lo é cegueira.
Conhecê-lo é doença.
Venerá-lo, morte.
Temê-lo sabedoria.
Não resistir a ele, redenção.
Deus mora atrás do Sol, o Diabo atrás da noite.
O que Deus traz à luz, o Diabo lança às trevas. Mas Abraxas
é o mundo, seu porvir e seu passar.
Sobre cada presente que vem do Deus-Sol, o Diabo roga sua
praga.
Tudo o que implorardes ao Deus-Sol provoca uma ação do
Diabo.
Tudo o que criardes com Deus-Sol, dá poder efetivo ao Diabo.
Esse é o terrível Abraxas.
É a criatura mais potente, e nele a criatura tem medo de si
mesma.
É a oposição manifesta da criatura ao pleroma e seu nada.
É o horror que o filho tem da mãe.
É o amor da mãe pelo filho.
É a alegria da Terra e a crueldade dos céus.
Diante do seu semblante o homem fica que nem pedra.
Diante dele não há pergunta nem respostas.
É a vida da criatura.
É a manifestação da individualidade.
É o amor do homem.
É a linguagem do homem.
É a aparição e a sombra do homem.
É a realidade ilusória.
Então os mortos, por estarem consumados, gemeram e esbravejaram.
IV Sermão.
Os mortos encheram de murmúrios o recinto e disseram: fala-nos dos deuses e dos diabos, maldito!
O Deus-Sol é o bem supremo; o Diabo o oposto. Assim, tendes dois deuses. Mas há muitas coisas supremas e boas e muitos males enormes. Entre estes há dois deuses-diabos: um, o ARDENTE, outro, o CRESCENTE.
O ardente é ÉROS, que tem forma de chama. A chama da luz
porque se consome.O crescente é a
ARVORE DA VIDA. Germina e ao crescer se acumula de coisas vivas.Eros se inflama e morre. Mas a arvore da vida
cresce lenta e constantemente, por tempo incomensurável.
O Bem e o Mal estão unidos na chama.
O Bem e o Mal estão unidos no crescimento da árvore.
Em suas divindades, a vida e o amor se opõem.
Inumerável como a hoste de estrelas é o numero de deuses e
diabos.
Cada estrela é um deus e cada espaço que ocupa, um diabo.
Mas a plenitude-vácuo é o pleroma.
A manifestação do todo é Abraxas, a quem só o inefetivo se
opõe.
Quatro é o numero das medidas do mundo.
O primeiro é começo, o Deus-Sol.
O segundo, Eros, une os extremos e se expande em luz.
O terceiro, a Arvore da Vida, ocupa o espaço com formas
corpóreas.
O quarto é o Diabo, que abre tudo que se acha fechado; desfaz
tudo que se constitui de natureza corpórea; é o destruidor em que tudo é
reduzido a nada.
Para mim, a quem foi dado o conhecimento da multiplicidade e
diversidade dos deuses, está bem. Mas ai de vós, que substituís esses múltiplos
incompatíveis por um deus único. Pois, assim fazendo, gerais o tormento que se
origina na falta de compreensão e mutilais a criatura cuja natureza e meta é a
individualidade. Como podereis ser fiéis à vossa própria natureza se vos
esforçais para transformar o múltiplo em uno? O que fizerdes com os deuses será
feito convosco. Ficais todos iguais e assim frustrais vossa natureza.
A igualdade prevalecerá, não para Deus mas apenas em
beneficio do homem. Pois muitos são os deuses, ao passo que poucos os homens.
Os deuses são poderosos e podem arcar com a multiplicidade. Pois, como as
estrelas, como permanecem solitários, separados por distancias imensas. Mas os
homens são fracos e não podem arcar com sua natureza múltipla. Por isso moram
juntos e precisam de comunhão para poder suportar o isolamento. Por amor à
redenção, ensino-vos a verdade rejeitada, por cujo amor sofri rejeição.
A multiplicidade dos deuses corresponde à multiplicidade dos
homens.Inúmeros deuses aguardam a condição humana.Inúmeros
foram homens. O homem partilha da natureza dos deuses. Vem dos deuses e vai
para deus.
Assim como de nada serve refletir sobre o pleroma, não
adianta venerar a multiplicidade dos deuses. E menos ainda venerar o primeiro
deus, a abundancia efetiva e o summum
bonum. Nada podemos acrescentar-lhe com nossa oração, e dele nada podemos
tirar; porque o vácuo efetivo tudo absorve. Os deuses brilhantes formam o
mundo celeste, que é múltiplo, e infinitamente disperso e crescente. O Deus-Sol
é o senhor supremo deste mundo.Os
deuses escuros formam o mundo terrestre. São simples, e infinitamente
decrescentes e minguantes. O Diabo é o mais abjeto senhor desse mundo, o
espírito- lunar, satélite terrestre, menor, mais frio e mais morto que a Terra.Não há diferença entre o poder dos deuses celestes e os dos terrestres.
Os celestes aumentam, os terrestres diminuem. Incomensurável é o movimento de
ambos.
V Sermão.
Os mortos escarneceram e vociferaram: Ensina-nos, tolo, a respeito da igreja e da santa comunhão.
O mundo dos deuses se torna manifesto na espiritualidade e na sexualidade. Os celestes aparecem na espiritualidade, os terrestres na sexualidade.A espiritualidade concebe e acalenta. É feminina e por isso a chamamos de MATER COELESTIS, a mãe celeste. A sexualidade gera e cria. Masculina, a chamamos de PHALLOS, o pai terrestre.A sexualidade do homem é mais da terra: a da mulher, mais espiritual.A espiritualidade do homem é mais do céu, vai mais para o vasto.A da mulher, mais da terra, vai para o mais ínfimo.Mendaz e diabólica é a espiritualidade do homem que vai para o mais ínfimo.Mendaz e diabólica é a espiritualidade da mulher que vai para o mais vasto.Cada um deve ir para seu próprio lugar.O homem e a mulher, quando não dividem seus caminhos espirituais, tornam-se diabos um para o outro, pois a natureza da criatura é a individualidade.A sexualidade do homem tem curso terreno, a da mulher, espiritual. O homem e a mulher, quando não distinguem sua sexualidade, tornam-se diabos um para o outro.O homem conhecera o menor, a mulher o maior. O homem se distinguira da espiritualidade e da sexualidade. Chamara à espiritualidade Mãe, colocando-o entre o céu e a terra. E a sexualidade Phallos, colocando-a entre si mesmo e a terra. Pois Mãe e Phallos são demônios super-humanos que revelam o mundo dos deuses. São para nós mais efetivos que os deuses, por terem maior afinidade com a nossa própria natureza. Se não vos distinguirdes da sexualidade e da espiritualidade e não as considerar-des de uma natureza além e acima de vós, então vos entregareis a elas como qualidades do pleroma. A espiritualidade e a sexualidade não são qualidades vossas, nem coisas possuís e contendes, mas que vos possuam e contêm; pois são demônios poderosos, manifestações dos deuses e, por conseguinte, coisas, que vos ultrapassam, e existentes em si mesmas. Nenhum homem tem espiritualidade ou sexualidade próprias. Mas coloca-se sob a lei da espiritualidade e da sexualidade.
Nenhum homem, pois, escapa desses demônios. Deveis considerá-los
como demônios que tem uma tarefa e um risco comuns, carga comum que a vida vos
legou. Assim a vida, para vós, também é tarefa e riscos comuns, como são os
deuses, e, acima de tudo, o terrível Abraxas.O homem é fraco, portanto a
comunhão é indispensável. Se vossa comunhão não estiver sob o signo da Mãe,
então está sob o signo de Phallos. Nenhuma comunhão é sofrimento e doença. A
comunhão em tudo é desmembramento e dissolução.
A individualidade leva ao isolamento. O isolamento se opõe à
comunhão. Mas por causa da fraqueza do homem contra os deuses e os demônios e
sua lei invencível, a comunhão é necessária. Portanto deve haver tanta comunhão
quanto for preciso, não por causa do homem, mas por causa dos deuses. Os deuses
vos forçam a comunhão. Quanto mais vos forçarem, maior será a necessidade de
comunhão, maior o mal.
Na comunhão, que cada homem se submeta aos demais, para que
seja mantida; pois precisais dela. No
isolamento, um homem será superior aos demais, para que todos possam vir a ele
e evitar a escravidão.
Na comunhão haverá continência.
No isolamento, prodigalidade.
Comunhão é profundeza.
Isolamento é elevação.
A medida certa na comunhão purifica e preserva.
No isolamento, purifica e aumenta.
A comunhão nos da calor, o isolamento luz.
VI Sermão.
O demônio da sexualidade se aproxima de nossa alma feito
serpente. Semi-humano surge como pensamento-desejo. O
da espiritualidade mergulha sobre nossa alma como pássaro branco. Semi-humano
surge como desejo-pensamento.A
serpente é uma alma terrena, semidemoniaca, um espírito, e semelhante aos
espíritos dos mortos. Assim, como estes, também pulula entre as coisas da
Terra, fazendo-nos temê-las ou espicaçando-nos com desejos imoderados. A
serpente tem natureza semelhante à da mulher. Sempre procura a companhia dos
mortos retidos pelo feitiço da Terra, os que não encontraram o caminho mais
além, que leva ao isolamento. A serpente é meretriz. Entrega-se a orgias com o
Diabo e com os maus espíritos; tirana e algoz maldosa, sempre seduz os mais
vis. O pássaro branco é uma alma semiceleste do homem. Dialoga com a Mãe,
descendo de quando em quando. O pássaro tem natureza semelhante à do homem, e é
pensamento efetivo. Casto e solitário é mensageiro da Mãe. Sobrevoa a terra a
grande altitude. Infunde isolamento. Dá ciência dos distantes que já se foram e
estão consumados. Leva nossa palavra à Mãe nas alturas. Ela intercede, avisa,
mas não dispõe de poder contra os deuses. É receptáculo do Sol. A serpente vai
para baixo e, com sua astucia, estropia o demônio fálico ou então incita-o a
prosseguir. Produz os pensamentos demasiado ardilosos do demônio terrestre,
aqueles pensamentos que se insinuam com desejo por cada furo e fenda em todas
as coisas.A
serpente, sem duvida, não quer, mas tem que ser útil a nós. Foge do nosso
alcance, mostrando-nos assim o caminho, que com nossa inteligência humana não
poderíamos encontrar.
Com olhar desdenhoso, disseram os mortos: Para de falar em deuses,
demônios e almas. No fundo, há muito já sabíamos disso.
VII Sermão.
Mas quando sobreveio a noite, os mortos avançaram de novo, com
lamentável aspecto, e disseram: Tem mais uma coisa que esquecemos de mencionar.
Ensina-nos sobre o homem.
O homem é pórtico, pelo qual, vindos do mundo exterior de deuses, demônios e almas passais para o mundo interior; saindo do mais vasto para penetrar no mais ínfimo. Pequeno e efêmero é o homem. Já se encontra atrás de vós e mais e mais uma vez vos achais no espaço sem fim, no menor ou mais íntimo infinito. A incalculável distancia paira uma estrela solitária no zênite.
Esse é o único deus desse homem. Esse o seu mundo, seu
pleroma, sua divindade.
Nesse mundo é homem Abraxas, o criador e destruidor de seu
próprio mundo.
Essa estrela é o deus e o destino do homem.
Esse o único deus que o guia. Nele vai o homem repousar.
Rumo a ele segue a longa jornada da alma depois da morte. Nele brilha como luz
tudo o que homem traz de volta do mundo mais vasto. A esse único deus o homem
erguerá suas preces. A prece intensifica
a luz da estrela. Lança uma ponte sobre a morte. Prepara a vida para o mundo
mais ínfimo e aplaca os desejos irrealizáveis do mais vasto. Quando o mais
vasto esfria, a Estrela arde.
Entre o homem e o seu deus único nada se interpõe, desde que
se possa desviar os olhos do espetáculo flamejante de Abraxas.
O homem aqui, deus lá.
A fraqueza e o nada aqui, lá o poder eternamente criador.
Aqui, nada além das trevas e gélida umidade.
Lá completamente sol.
Então os mortos se calaram e subiram feito fumaça de fogueira de pastor
que passou a noite zelando pelo rebanho.
ANAGRAMA:
NATRIHECCUNDE
GAINNEVERAHTUNIN
ZEHGESSURKLACH
ZUNNUS.
(Tradução de Milton Person)
Mario Quintana
Eu agora - que
desfecho!
Já nem penso
mais em ti...
Mas será que
nunca deixo
De lembrar que
te esqueci?
Mario Quintana
- Espelho Mágico
AH! OS
RELÓGIOS
Amigos, não
consultem os relógios
quando um dia
eu me for de vossas vidas
em seus fúteis
problemas tão perdidas
que até
parecem mais uns necrológios...
Porque o tempo
é uma invenção da morte:
não o conhece
a vida - a verdadeira –
em que basta
um momento de poesia
para nos dar a
eternidade inteira.
Inteira, sim,
porque essa vida eterna
somente por si
mesma é dividida:
não cabe, a
cada qual, uma porção.
E os Anjos
entreolham-se espantados
quando alguém
- ao voltar a si da vida –
acaso lhes
indaga que horas são...
Mario Quintana
- A Cor do Invisível
DAS UTOPIAS
Se as coisas
são inatingíveis... ora!
Não é motivo
para não querê-las...
Que tristes os
caminhos se não fora
A mágica
presença das estrelas!
Mario Quintana
- Espelho Mágico
POEMINHA DO
CONTRA
Todos estes
que aí estão
Atravancando o
meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!
Mario Quintana
O SILÊNCIO
Convivência
entre o poeta e o leitor, só no silêncio da leitura a sós. A sós, os dois. Isto
é, livro e leitor. Este não quer saber de terceiros, n ão quer que interpretem,
que cantem, que dancem um poema. O verdadeiro amador de poemas ama em
silêncio...
Mario Quintana
- A vaca e o hipogrifo
EU ESCREVI UM
POEMA TRISTE
Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas
da sua tristeza.
Não vem de ti
essa tristeza
Mas das
mudanças do Tempo,
Que ora nos
traz esperanças
Ora nos dá
incerteza...
Nem importa,
ao velho Tempo,
Que sejas fiel
ou infiel...
Eu fico, junto
à correnteza,
Olhando as
horas tão breves...
E das cartas
que me escreves
Faço barcos de
papel!
Mario Quintana
- A Cor do Invisível
CANÇÃO DO AMOR
IMPREVISTO
Eu sou um
homem fechado.
O mundo me
tornou egoísta e mau.
E a minha
poesia é um vício triste,
Desesperado e
solitário
Que eu faço
tudo por abafar.
Mas tu
apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu
passo leve,
Com esses teus
cabelos...
E o homem
taciturno ficou imóvel, sem compreender
nada, numa
alegria atônita...
A súbita, a
dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem
pousar os passarinhos.
Mario Quintana
RECORDO AINDA
Recordo ainda...
e nada mais me importa...
Aqueles dias
de uma luz tão mansa
Que me
deixavam, sempre, de lembrança,
Algum
brinquedo novo à minha porta...
Mas veio um
vento de Desesperança
Soprando
cinzas pela noite morta!
E eu pendurei
na galharia torta
Todos os meus
brinquedos de criança...
Estrada afora
após segui... Mas, aí,
Embora idade e
senso eu aparente
Não vos
iludais o velho que aqui vai:
Eu quero os
meus brinquedos novamente!
Sou um pobre
menino... acreditai!...
Que
envelheceu, um dia, de repente!...
Mario Quintana
BILHETE
Se tu me amas,
ama-me
baixinho.
Não o grites
de cima dos telhados,
deixa em paz
os passarinhos.
Deixa em paz a
mim!
Se me queres,
enfim,
.....tem de
ser bem devagarinho,
.....amada,
.....que a
vida é breve,
.....e o amor
.....mais
breve ainda.
Mario Quintana
OS POEMAS
Os poemas são
pássaros que chegam
não se sabe de
onde e pousam
no livro que
lês.
Quando fechas
o livro, eles alçam vôo
como de um
alçapão.
Eles não têm
pouso
nem porto;
alimentam-se
um instante em cada
par de mãos e
partem.
E olhas,
então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado
espanto de saberes
que o alimento
deles já estava em ti...
Mario Quintana
- Esconderijos do Tempo
A VIDA
A vida são
deveres que nós trouxemos pra fazer em casa.
Quando se vê
já são seis horas!
Quando se vê,
já é sexta-feira...
Quando se vê,
já terminou o ano...
Quando se vê,
passaram-se 50 anos!
Agora, é tarde
demais para ser reprovado...
Se me fosse
dado, um dia, outra oportunidade,
eu nem olhava
o relógio.
Seguiria
sempre em frente
e iria
jogando, pelo caminho,
a casca
dourada inútil das horas...
Dessa forma eu
digo:
não deixe de
fazer algo que gosta
devido à falta
de tempo.
A única falta
que terá, será desse tempo
que
infelizmente... não voltará mais.
Mario Quintana
DOMINGO
Amar: Fechei
os olhos para não te ver
e a minha boca
para não dizer...
E dos meus
olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei,
e da minha
boca fechada nasceram sussurros
e palavras
mudas que te dediquei...
O amor é
quando a gente mora um no outro.
SIMULTANEIDADE
- Eu amo o
mundo! Eu detesto o mundo! Eu creio em Deus! Deus é um absurdo! Eu vou me
matar! Eu quero viver!
- Você é
louco?
- Não, sou
poeta.
Mario Quintana
- A vaca e o hipogrifo
Um bom poema é
aquele que nos dá a impressão
de que está
lendo a gente ... e não a gente a ele!
Mario Quintana
- A vaca e o hipogrifo
CLAREIRAS
Se um autor
faz você voltar atrás na leitura, seja de um período ou de uma simples frase,
não o julgue profundo demais, não fique complexado: ou inferior é ele.
A atual crise
de expressão, que tanto vem alarmando a velha-guarda que morre mas não se
entrega, não deve ser propriamente de expressão, mas de pensamento. Como é que
pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Em meio à
intrincada selva selvaggia de nossa literatura encontram-se às vezes, no
entanto, repousantes clareiras. E clareira pertence à mesma família etimológica
de clareza... Que o leitor me desculpe umas considerações tão óbvias. É que eu
desejava agradecer, o quanto antes, o alerta repouso que me proporcionaram três
livros que li na última semana: Rio 1900 de Brito Broca, Fronteira, de Moysés
Vellinho e Alguns Estudos, de Carlos Dante de Moraes.
Porque, ao ler
alguém que consegue expressar-se com toda a limpidez, nem sentimos que estamos
lendo um livro: é como se o estivéssemos pensando.
E, como também
estive a folhear o velho Pascall, na edição Globo, encontrei providencialmente
em meu apoio estas palavras, à pág. 23 dos Pensamentos:
"Quando
deparamos com o estilo natural, ficamos pasmados e encantados, como se
esperássemos ver um autor e encontrássemos um homem".
Mario Quintana
- A vaca e o hipogrifo
PEQUENO
ESCLARECIMENTO
Os poetas não
são azuis nem nada, como pensam alguns supersticiosos, nem sujeitos a ataques
súbitos de levitação. O de que eles mais gostam é estar em silêncio - um
silêncio que subjaz a quaisquer escapes motorísticos e declamatórios. Um
silêncio... Este impoluível silêncio rm que escrevo e em que tu me lês.
Mario Quintana
- A vaca e o hipogrifo
Escrevo diante da janela aberta.
Minha caneta é
cor das venezianas:
Verde!... E
que leves, lindas filigranas
Desenha o sol
na página deserta!
Não sei que
paisagista doidivanas
Mistura os
tons... acerta... desacerta...
Sempre em
busca de nova descoberta,
Vai colorindo
as horas quotidianas...
Jogos da luz
dançando na folhagem!
Do que eu ia
escrever até me esqueço...
Pra que
pensar? Também sou da paisagem...
Vago, solúvel
no ar, fico sonhando...
E me
transmuto... iriso-me... estremeço...
Nos leves
dedos que me vão pintando!
OBSESSÃO DO
MAR OCEANO
Vou andando
feliz pelas ruas sem nome...
Que vento bom
sopra do Mar Oceano!
Meu amor eu
nem sei como se chama,
Nem sei se é
muito longe o Mar Oceano...
Mas há vasos
cobertos de conchinhas
Sobre as
mesas... e moças na janelas
Com brincos e
pulseiras de coral...
Búzios
calçando portas... caravelas
Sonhando
imóveis sobre velhos pianos...
Nisto,
Na vitrina do
bric o teu sorriso, Antínous,
E eu me
lembrei do pobre imperador Adriano,
De su'alma
perdida e vaga na neblina...
Mas como sopra
o vento sobre o Mar Oceano!
Se eu morresse
amanhã, só deixaria, só,
Uma caixa de
música
Uma bússola
Um mapa
figurado
Uns poemas
cheios de beleza única
De estarem
inconclusos...
Mas como sopra
o vento nestas ruas de outono!
E eu nem sei,
eu nem sei como te chamas...
Mas nos
encontramos sobre o Mar Oceano,
Quando eu
também já não tiver mais nome.
Mario Quintana
- O Aprendiz de Feiticeiro
DA OBSERVAÇÃO
Não te
irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a
frio, o coração alheio.
Farás, assim,
do mal que eles te querem,
Teu mais
amável e sutil recreio...
Mario Quintana
- Espelho Mágico
DOS MUNDOS
Deus criou
este mundo. O homem, todavia,
Entrou a
desconfiar, cogitabundo...
Decerto não
gostou lá muito do que via...
E foi logo
inventando o outro mundo.
Mario Quintana
- Espelho Mágico
DA DISCRIÇÃO
Não te abras
com teu amigo
Que ele um
outro amigo tem.
E o amigo do
teu amigo
Possui amigos
também...
Mario Quintana
- Espelho Mágico
O MAPA
Olho o mapa da
cidade
Como quem
examinasse
A anatomia de
um corpo...
(É nem que
fosse o meu corpo!)
Sinto uma dor
infinita
Das ruas de
Porto Alegre
Onde jamais
passarei...
Há tanta
esquina esquisita,
Tanta nuança
de paredes,
Há tanta moça
bonita
Nas ruas que não
andei
(E há uma rua
encantada
Que nem em
sonhos sonhei...)
Quando eu for,
um dia desses,
Poeira ou
folha levada
No vento da
madrugada,
Serei um pouco
do nada
Invisível,
delicioso
Que faz com
que o teu ar
Pareça mais um
olhar,
Suave mistério
amoroso,
Cidade de meu
andar
(Deste já tão
longo andar!)
E talvez de
meu repouso...
Mario Quintana
- Apontamentos de História Sobrenatural
OS DEGRAUS
Não desças os
degraus do sonho
Para não
despertar os monstros.
Não subas aos
sótãos – onde
Os deuses, por
trás das suas máscaras,
Ocultam o
próprio enigma.
Não desças,
não subas, fica.
O mistério
está é na tua vida!
E é um sonho
louco este nosso mundo...
Mario Quintana
- Baú de Espantos
POEMINHA
SENTIMENTAL
O meu amor, o
meu amor, Maria
É como um fio
telegráfico da estrada
Aonde vêm
pousar as andorinhas...
De vez em
quando chega uma
E canta
(Não sei se as
andorinhas cantam, mas vá lá!)
Canta e vai-se
embora
Outra, nem
isso,
Mal chega,
vai-se embora.
A última que
passou
Limitou-se a
fazer cocô
No meu pobre
fio de vida!
No entanto,
Maria, o meu amor é sempre o mesmo:
As andorinhas
é que mudam.
Mario Quintana
- Preparativos de Viagem
SEMPRE QUE
CHOVE
Sempre que
chove
Tudo faz tanto
tempo...
E qualquer
poema que acaso eu escreva
Vem sempre
datado de 1779!
Mario Quintana
- Preparativos de Viagem
INSCRIÇÃO PARA
UM PORTÃO DE CEMITÉRIO
Na mesma pedra
se encontram,
Conforme o
povo traduz,
Quando se
nasce - uma estrela,
Quando se
morre - uma cruz.
Mas quantos
que aqui repousam
Hão de
emendar-nos assim:
"Ponham-me
a cruz no princípio...
E a luz da
estrela no fim!"
Mario Quintana
- A Cor do Invisível
O PIOR
O pior dos
problemas da gente é que ninguém tem nada com isso.
Mario Quintana
- Caderno H
EXAME DE
CONSCIÊNCIA
Se eu amo o
meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?
Mario Quintana
- Caderno H
A GRANDE
SURPRESA
Mas que susto
não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo...
Mario Quintana
- Caderno H
EVOLUÇÃO
O que me
impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é
este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.
Mario Quintana
- Caderno H
MÚSICA
O que mais me
comove em música
São estas
notas soltas
- pobres notas
únicas –
Que do teclado
arranca o afinador de pianos.
URBANÍSTICA
Como seriam
belas as estátuas equestres se constassem apenas dos cavalos!
Mario Quintana
Canção do dia de sempre
Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...
Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...
E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...
E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.
Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!
E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...
Mario Quintana ( livro Canções de Mário Quintana)
CARTA
Meu caro
poeta,
Por um lado
foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria
sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí
a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens,
nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola
tracada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para
mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com
isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os
românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade,
cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto
até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que
lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono.
Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os
súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a
escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem
são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da
contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto
compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que
sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas
pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus
limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos
trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a
cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais
individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o
condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é
essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico.
Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!
Meu poeta, se
estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as
disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua,
que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo
quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos
professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que
se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas
que a gente faz mas não diz.
A poesia é um
fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de
trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta
para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei
como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem
que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem
respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua
associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter
sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas
nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio,
já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o
trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso.
Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram
puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito
abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é
quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de
menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.
Como vês, para
isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O
desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão
ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe
darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu
não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para
indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técninca dessa
luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus
próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que,
quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.
Em todo caso,
bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que
só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras
naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que
muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a
gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo,
adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na
verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem
for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema,
aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos
dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem
aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um
esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo,
me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de
enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica.
Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces,
ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.
Agora, que
poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te
ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm,
pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que
chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome
universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram
indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.
Enfim, meu
poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a
vinte anos. Combinado?
Mario Quintana por Mario Quintana
( texto
escrito pelo poeta para a revista Isto É de 14/11/1984 )
Nasci em
Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me
aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! eu sempre achei que
toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos
meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse
uma confissão. Há ! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas... Aí vai !
Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas : ou se está vivo ou morto.
Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a eternidade.
Nasci do rigor
do inverno, temperatura : 1 grau; e ainda por cima prematuramente, o que me
deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia
descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro – o
mesmo tendo acontecido a Sir Isaac Newton ! Excusez du peu.
Prefiro citar
a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão
orgulhoso que nunca acho que escrevi algo à minha altura. Porque poesia é
insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz.
Dizem que sou tímido. Nada disso ! sou é caladão, instrospectivo. Não sei por
que sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como
os outros ?
Exatamente por
execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da
poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez
concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de fármacia durante 5
anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de
Oliveira, de Erico Veríssimo – que bem sabem ( ou souberam) , o que é a luta
amorosa com as palavras.
Mario Quintana
Presença
É preciso que
a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil
exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas
ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que
a tua ausência trescale
sutilmente, no
ar, a trevo machucado,
as folhas de
alecrim desde há muito guardadas
não se sabe
por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso,
também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te,
azul e luminosa, no ar.
É preciso a
saudade para eu sentir
como sinto -
em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando
surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te
pareces com o teu retrato...
E eu tenho de
fechar meus olhos para ver-te.
Mario Quintana
(Melhores Poemas - 9o.edição - Global Editora)
UM DIA (ou UM DIA DESCOBRIMOS...)
Um dia descobrimos que beijar uma pessoa
para esquecer outra é bobagem.
Você não só não esquece a outra pessoa como
pensa muito mais nela....
Um dia nós percebemos que as mulheres tem
instinto "caçador" e fazem qualquer homem sofrer...
Um dia descobrimos que se apaixonar é
inevitável...
Um dia percebemos que as melhores provas de
amor são as mais simples...
Um dia percebemos que o comum não nos
atrai...
Um dia saberemos que ser classificado como
o "bonzinho" não é bom...
Um dia perceberemos que a pessoa que nunca
te liga é a que mais pensa em você...
Um dia saberemos a importância da frase:
"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas..."
Um dia percebemos que somos muito
importantes para alguém, mas não damos valor a isso...
Um dia percebemos como aquele amigo faz
falta, mas aí já é tarde demais...
Enfim... um dia descobrimos que apesar de
viver quase um século esse tempo todo não é suficiente para realizarmos todos
os nossos sonhos, para beijarmos todas as bocas
que nos atraem, para dizer tudo o que tem que ser dito naquele momento.
que nos atraem, para dizer tudo o que tem que ser dito naquele momento.
Não existe hora certa para dizer o que
sentimos se quem estiver te ouvindo não te compreender, não te merecer...
O jeito é: ou nos conformamos com a falta
de algumas coisas na nossa vida ou lutamos para realizar todas as nossas
loucuras...
Quem não compreende um olhar tampouco
compreenderá uma longa explicação.
Autor Desconhecido - Não é de Mario
Quintana!
O TEMPO
Com o tempo, você vai percebendo que para
ser feliz com uma outra pessoa, você precisa, em primeiro lugar, não precisar
dela.
Percebe também que aquele alguém que você
ama (ou acha que ama) e que não quer nada com você, definitivamente não é o
alguém da sua vida. Você aprende a gostar de você, a cuidar de você e,
principalmente, a gostar de quem também gosta de você.
O segredo é não correr atrás das
borboletas... é cuidar do jardim para que elas venham até você.
No final das contas, você vai achar não
quem você estava procurando, mas quem estava procurando por você!
Autor Desconhecido - Não é de Mario
Quintana!
Remissão.
De noite, no meu leito,
busquei o amado de minha alma,
busquei-o e não o achei.
Você esta dormindo,você esta dormindo,
perceba a chuva
escute os pingos da goteira
eu sabia que choveria de novo
você não esperava que chovesse manso assim
escute os pingos sinta o frio
eu sabia que esfriaria de novo assim
e você dorme
e não esperava por essa chuva eu sei
por muito tempo eu esperei
e, no entanto, entretanto você dorme.
e finalmente a mesma chuva admirado assustado você estava eu
não estava
só estranhei o seu olhar quando chegou tão de repente
você nem sabia ha quanto tempo
eu esperei tanto aquela noite a mesma noite
e o sussurro da mesma chuva calma e fria
você nem lembra estes pingos eu contei em pensamento
e hoje o sono faz seu silencio perceba o frio pontiagudo nos
seus ossos
e quanto a mim eu esperei por esta noite em meu silencio
e agora os pingos posso contá-los como os contei naquela
noite
a luz tão fraca como antes até o ar tem o mesmo cheiro
você apareceu tão de repente todo molhado respingando a
chuva que mansa caia e em
silencio pingavam gotas dos seus cabelos
por muito tempo sem dizer nada nos olhamos paralisados
ouvindo a chuva
seus olhos duros frios furavam-me os seios descobertos
e aos seus pés quase uma poça já se formava
você no frio naquela chuva há tanto tempo e não tremia e não
se mexia mas tinha frio
aquele vento trazendo o inverno eu sentia nos seios nus
a porta aberta a chuva escancarando a escuridão
e pude ver num clarão vindo do céu um vulto longe
você não viu ele se foi e aquela imagem eu guardei como um
retrato do meu amor
a luta a luta...e agora aqui o mesmo vento o mesmo frio a
mesma noite
abra a porta não é preciso é o mesmo frio
por tantos anos tantas noites eu esperei e não dormi
que risque agora este negrume raio bendito
venha
corisco urre trovão eu estou aqui
me mostre o vulto pinte de novo esse retrato do meu amor
guie meu
corpo escreva minha sina leva-me ao fim.
Socorro Teatro.
Teatro, vem em meu socorro!
Durmo, desperta-me
Estou perdida no escuro, guia-me ao menos para uma vela
Estou preguiçosa, faze-me (ter) vergonha
Estou cansada, levanta-me
Estou indiferente, bata-me
Permaneço indiferente, quebra-me a cara
Tenho medo, encoraja-me
Sou ignorante, educa-me
Sou monstruosa, humaniza-me
Sou pretensiosa, faz-me morrer de rir
Sou cínica, embaraça-me
Sou besta, transforma-me
Sou antipática, pune-me
Sou dominante e cruel, combate-me
Sou pedante, zomba de mim
Sou vulgar, eleva-me
Estou muda, solta-me
Não sonho mais, trata-me como covarde ou imbecil
Esqueci, lança sobre mim a Memória
Sinto-me velha e passada, faz surgir à infância
Estou pesada, dá-me a Musica
Estou triste, vai procurar alegria
Estou surda na tempestade, faz rugir a dor
Estou agitada, faz crescer a Sabedoria
Estou frágil, incendeia a Amizade
Estou cega, convoca todas as luzes
Estou submetida à Feiúra, faz entrar a Beleza conquistadora
Fisgada pelo Ódio, faz surgirem todas as forças do Amor.
Mensagem de Ariane
Mnouchkine lida por ela na UNESCO, quinta feira, 31 de março de 2005, na
ocasião da jornada mundial de teatro.
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